Ahhh... Se eu pudesse ter um corpo de vinte anos com a maturidade que tenho hoje... Já ouviu essa frase? Ela costuma ser dita por pessoas mais velhas e está intimamente relacionada à preocupação com a saúde e com a aparência física. Eu digo costuma porque o sentimento de que a vida passa rápido demais não é “privilégio” dos idosos, os mais jovens também têm expressado essa sensação.
Quando crianças, sentimos a passagem do tempo de um modo bem diferente... Nessa fase o mundo é uma caixinha de surpresas e o aprendizado é constante, estamos atentos a tudo! Cada nova palavra lida, brincadeira ou emoção sentida vem acompanhada do sopro da novidade. Sentimos o vento beijar o nosso rosto, ouvimos atentamente o canto dos pássaros e rimos das coisas mais tolas.
Crescemos e ingressamos velozmente no cataclisma das obrigações, aquelas que nos arrastam para dias previsíveis e repetitivos, como se fossem embalados sempre pela mesma música. Tornamo-nos ranzinzas e isso não se deve a idade, mas ao (des)gosto de ver a vida sem sabor, devorada por compromissos inadiáveis, agendas repletas de tudo, menos de nós mesmos! Com o tempo... O vento só serve para desalinhar nossos cabelos, o pássaro já está rouco de tanto cantar para a nossa indiferença e as piadas têm que ser cada vez mais pesadas para arrancar o riso.
Envelhecer está muito mais associado à falta de paixão pela vida do que às rugas ou aos cabelos brancos. O que pensar dos idosos que têm os seus dias repletos de novidades e de desafios, que anseiam pelo dia seguinte feito crianças? O que pensar dos “jovens” que cumprem rotinas desgastantes e monocromáticas? Quem é o verdadeiro idoso? Saber quem é o idoso físico não requer uma grande inteligência, mas identificar o idoso emocional é bem mais difícil. O escritor e humorista Millôr Fernandes tem uma frase que resume de forma magistral o processo de envelhecimento: “Qualquer idiota consegue ser jovem. É preciso muito talento pra envelhecer.”
Eu vou mais longe, é necessário muito talento para viver seja na idade que for, todos nós iremos morrer, porém nem todos irão ter vivido. Quando ouço Nana Caymmi cantar a música ‘Resposta ao Tempo’ sempre penso nisso:
... Respondo que ele aprisiona...Eu liberto...Que ele adormece as paixões...Eu desperto...E o tempo se rói... Com inveja de mim ...Me vigia querendo aprender...Como eu morro de amor...Prá tentar reviver...
Quero que o tempo me inveje e torture-se de incômodo pelo meu jeito de me relacionar com a vida. Desejo que ele se sinta desafiado pela minha intensidade e desejo voraz de sentir cada momento. Envelhecer fisicamente não é opcional, mas envelhecer emocionalmente é!
A vida é sábia, não existe amadurecimento sem desapego. Sorte daqueles que conseguirem entender o grande insight existencial que é envelhecer. Sorte de quem compreender que a gente tem que perder algumas coisas para absorver outras. Sorte de quem não perder tempo com bobagens e amarguras, que tiver doces lembranças pelas quais possa suspirar e novos sonhos para realizar. Sorte de quem não se levar a sério demais e conseguir rir de si mesmo, de quem conseguir proteger a criança que habita o seu interior, porque no fundo, se você olhar bem... A vida é uma grande brincadeira de pessoas de todas as idades.
Ligia Guerra
Nenhum comentário:
Postar um comentário