(Texto extraído do
livro "Mania de Explicação da Adriana Falcão)
"Era uma menina
que gostava de inventar uma explicação para cada coisa...
Solidão é uma ilha
com saudade de barco.
Saudade é quando o
momento tenta fugir da lembrança pra acontecer de novo e não consegue.
Lembrança é quando,
mesmo sem autorização, seu pensamento reapresenta um capítulo.
Autorização é quando
a coisa é tão importante que só dizer “eu deixo” é pouco.
Pouco é menos da
metade.
Muito é quando os
dedos da mão não são suficientes.
Desespero são dez
milhões de fogareiros acesos dentro de sua cabeça.
Angústia é um nó
muito apertado bem no meio do sossego.
Agonia é quando o
maestro de você se perde completamente.
Preocupação é uma
cola que não deixa o que não aconteceu ainda sair de seu pensamento.
Indecisão é quando
você sabe muito bem o que quer mas acha que devia querer outra coisa.
Certeza é quando a
idéia cansa de procurar e pára.
Intuição é quando
seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.
Pressentimento é
quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.
Renúncia é um não
que não queria ser ele.
Sucesso é quando
você faz o que sempre fez só que todo mundo percebe.
Vaidade é um espelho
onisciente, onipotente e onipresente.
Vergonha é um pano preto que você quer pra se
cobrir naquela hora.
Orgulho é uma
guarita entre você e o da frente.
Ansiedade é quando
faltam cinco minutos sempre para o que quer que seja.
Indiferença é quando
os minutos não se interessam por nada especialmente.
Interesse é um ponto
de exclamação ou de interrogação no final do sentimento.
Sentimento é a
língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.
Raiva é quando o
cachorro que mora em você mostra os dentes.
Tristeza é uma mão
gigante que aperta seu coração.
Alegria é um bloco
de Carnaval que não liga se não é fevereiro.
Felicidade é um
agora que não tem pressa nenhuma.
Amizade é quando
você não faz questão de você e se empresta pros outros.
Decepção é quando
você risca em algo ou em alguém um xis preto ou vermelho.
Desilusão é quando
anoitece em você contra a vontade do dia.
Culpa é quando você
cisma que podia ter feito diferente, mas, geralmente, não podia.
Perdão é quando o
Natal acontece em maio, por exemplo.
Desculpa é uma frase
que pretende ser um beijo.
Excitação é quando
os beijos estão desatinados pra sair de sua boca depressa.
Desatino é um
desataque de prudência.
Prudência é um
buraco de fechadura na porta do tempo.
Lucidez é um acesso
de loucura ao contrário.
Razão é quando o
cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.
Emoção é um tango
que ainda não foi feito.
Ainda é quando a
vontade está no meio do caminho.
Vontade é um desejo
que cisma que você é a casa dele.
Desejo é uma boca
com sede.
Paixão é quando
apesar da placa “perigo” o desejo vai e entra.
Amor é quando a
paixão não tem outro compromisso marcado.
Não. Amor é um
exagero… Também não.
É um desadoro… Uma
batelada?
Um enxame, um
dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um
descontrole, uma necessidade, um desapego?
Talvez porque não
tivesse sentido, talvez porque não houvesse explicação, esse negócio de amor
ela não sabia explicar, a menina.
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